Cave
Na cave desse prédio mora um horroroso animalDesprovido de regras, de costumes e qualquer tipo de moral.
Vive de alimentar essa sua fome natural
De tudo um pouco o que os de cima vêem como Mal...
Não vive feliz esse animal.
Vive enraivecido e embrutecido
Nú de sentimentos, incapaz de sentir
Preso e agaiolado, sem vontade de fugir!
Como chegou tão fundo?
Foi um dia em que um homem belo e elegante,
Que passeava pelas ruas, admirava as cores
Alegrava-se com os ruídos, cumprimentava as pessoas...
As pessoas, a sua queda!
Agradava a todas sem exepção
Até aquelas que nada lhe eram.
Procurava viver, numa semana, tudo o que a vida lhe oferecia
Não durou pessoa mais de um dia!
Vencido pelos prazeres da carne à segunda-feira,
Entregou-se ali logo a uma rameira de fina-flor
Que o mergulhou com cigarros num torpor inebriante
Com o qual contagia quem na sua cave entra!
Na cave do meu prédio mora um animal.
Ser estranho e perverso, que me torna aos outros adverso,
Que me arrasta para baixo, me devora,
Sentimentos néscios traz cá para fora...
Viu no outro dia, pela janela, uma criança.
Espantou-se com o seu ar de abelha mansa,
Gatinhou até às grades da janela e apreciou
O seu andar; com atenção olhou a sua figura
E uma pata lançou pela ranhura das grades
Querendo nela enfiar as suas garras aguçadas.
Sabe bem como fala a criatura
Que nessa cave se deita na pedra dura
Sorvendo ervas que vieram da lonjura do mar
E que suaves perfumes deitam no ar.
À medida que se sopram, puf... puf...
Adormecendo-me os sentidos, ficando mais e mais perdido
Quanto mais me acho e encontro.
Puf... Puf...
Lembro a criança... Cintura fininha e peitos já salientes
Nos meus membros sinto já formigueiros
E meus pensamentos esvoaçam para dias mais quentes
De areias tórridas, onde leis do Homens
Não amarram animais em caves frias.
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