Segunda-feira, Junho 20, 2005

Morre Comigo

São as mãos vazias que te abraçam
Por entre os versos no chão deste
Teu poema.

Costumas dizer-me que a noite morre nos meus olhos
Como o amor
E o meu pânico cresce.
Como pode morrer o amor?

Há horas em que sei que o único abrigo
És tu com jarras de silêncio
Onde me desfaço
E noutras vezes
(tantas vezes...)
É na tua voz que me invento e renasço.

Porque o homem que procuro
No tempo vencido
É só um pouco mais de esperança
Nesta madrugada
Que me desenha
Outra insónia mais a magoar-me,
Outro dia a amanhecer
Que me alcança

Não adormeças.
Deixa as pálpebras em êxtase
Perturbar este silêncio
Que me invade
Como a solidão

E, depois,
Vulnerável e ferido
Deita-te a meu lado
Sem nome, sem música, sem mar
E morre comigo.

Vanessa Pelerigo

Etiquetas:

Domingo, Junho 05, 2005

Ofegante...
O meu olhar fazendo-te vibrar
A respiração ruidosa, galopante
No meu toque o teu despertar
Ergues-te, inebriada e cambaleante
Aproximo-me...

Segues-me...
Por entre uma ténue luz prateada
Encontrares os lábios que te enlevam
E afastam do teu coração, a geada
Aqueço-te...

Etiquetas:

Sexta-feira, Junho 03, 2005

Asas de um pensamento...

Olho perdido os rostos que se afastam para lá da vidraça...
Na mão a chávena; no seu interior o café tépido que insisto em agitar removendo das paredes os últimos vestígios de acúcar, que teimavam em colar numa massa castanha... Lentamente coloco a mão no bolso direito retirando o maço de tabaco carcomido e retiro um dos meus últimos cigarros... Penso um pouco e volto a recolocar o cigarro no maço.
Entretanto mais uma figura recorta o meu estreito horizonte em grande velocidade deixando-me uma saudação... Amigo? Inimigo? Pouco interessa... Retribuo com um gesto melancólico o cumprimento.
Volta a olhar para a janela do meu lado esquerdo... lá fora pequenos flocos brancos teimam em cair. Começo a sorrir aparvalhado. Estranho pensamento este de uma tempestade de neve em plena primavera asfixiante, em que o calor me percorre a fronte originando as gotas de suor que me cobrem a testa, e que ao mesmo tempo me procuram dar um pouco de hidratação, no inferno que se torna este espaço no qual partilho o meu pensamento de fim de tarde...
Estranho como sozinho construo o meu ode triunfal de glória alguma, que nem consigo descobrir qual. E como ao mesmo tempo partilho comigo próprio esta tristeza que sou incapaz de explicar... tão ínfima... tão pequena no mar de desgraças que tolda este mundo. Mas nós próprios somos talvez um mundo... sim pequeno! mas sempre um mundo! Tão nosso, tão importante!
E neste pensamento quiçá um pouco egoísta, nova reflexão profunda... Quão ridiculo o ódio quotidiano, toda a irritação que nos perturba, mergulhando-nos num caos, tão banal, tão mesquinho, tão humano.
Volto a sorrir curioso com a minha própria dissertação... O calor abafa-me cada vez mais... A desilusão que sinto, a frustração que me tolda o pensamento torna-se motivo da minha própria auto-chacota, enquanto volto a olhar para o exterior vendo agora aqueles flocos se toldarem com o alaranjado crescente de um enorme sol poente...
A cor inspira-me, levanto-me calmamente e a imagem de uma cerveja fresca apaga todo o marasmo existencial em que parecia cair.
É tempo de ir... Porque a noite ainda é uma criança... no seu leito de concepção.

Etiquetas: